Madeleine Alves
Quem me dera asas de pomba!
Eu voaria, e descansaria.
Certamente fugiria para longe;
moraria no deserto. Selá
Apressar-me-ia para escapar
do vento tempestuoso, da tempestade."
(Salmo 55)
Todas as taças partidas contêm inebriante vinho de sangue, extraído de tonéis de âmago e derramado nas linhas que lês.
O concerto não tem conserto:
cordas desafinadas desalinham uma possível harmonia.
Notas na melodia. Nota a melodia.
Nos lustres, as luzes bruxuleiam. Ilustre conviva, o combustível se acaba onde começa a penumbra. Extingue-se onde começa a escuridão.
Já não precisarias de máscaras, mas as ostentas com galhardia. Airoso, deslizas pelo salão irradiando azulejaluz, que se entrevê nas frestas e falhas da máscara.
Vejo a contradição pela janela, do lado de fora. Eu, que só sei ser e voar, pouso em ti meus olhos e nada entendo. Eu, que abro mão deste baile por assim não saber dançar.
Entraria com âmbar luz por entre os vãos e vidros e cristais, dotada de estrondosa percussão a evocar alegria e felicidade. Então, cairiam ornamentos e roupas e máscaras. A corte seria exposta e todos se veriam como são.
Contudo, há o status quo. O protocolo. A pantomima. E os jogos de azar. Há quanto vira e vira e vira a ampulheta, fazendo a areia escorrer e se depositar no bojo do empoeirado vidro?
Prefro voar — correr os bosques, banhar-me na cachoeira, mergulhar no mar, sentir o gosto das frutas, o gozo dos olores, o vento nos anelares cachos e os atabaques nos tímpanos.
Deixo-te de mirar. Sê feliz. Eu serei feliz.
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